Nota sobre Suburbano coração
Por Humberto Werneck
Letra
Outro parceiro, Tom Jobim, impressiona-se com a necessidade que Chico tem de se isolar para produzir. "Com Vinícius, a gente compunha bebendo, falando, havia uma certa falastrice", diz Tom. Com o Chico, não, ele não precisa de ninguém." Juntos, fizeram canções como Eu te amo e Anos dourados, além de Retrato em branco e preto e Sabiá. Chico, por sua vez, acha graça na forma que o parceiro tem de demonstrar que não gostou de uma letra. "Ele diz que está ótimo, e começa a escrever em cima." Ou simplesmente avacalha - como fez com o que viria a ser, anos mais tarde, a letra de Suburbano coração. Chico trabalhava nos versos da introdução:
Quem vem lá que horas são?
Isso não são horas
que horas são?
É você, é o ladrão
que Tom insistia em transformar em algo assim:
Quem vem lá?
E o ladrão
É o sapatão
Neste caso, é claro, a parceria capotou. De imediato, Chico aproveitou apenas o nome, Que horas são, para aquela música inexistente inscrita no Festival Internacional da Cancão que marcou o início de sua briga com a Rede Globo, em 1971. Houve entre ele e Tom outra parceria que também não prosperou, desta vez por culpa sua: Tom lhe pediu letra para Wave, e Chico não conseguiu ir além do primeiro verso: Vou te contar. "Pois é, quem acabou contando fui eu", ri Tom Jobim, que se cansou de esperar e fez sozinho o resto da letra. No caso de Lígia, ele ofereceu parceria a Chico, por conta de uns palpites:
Esqueci no piano
as bobagens de amor
que eu iria dizer
[...]
Um chope gelado em Copacabana
- mas o amigo não aceitou: "Dei só uma ajeitadinha, foi só um dedinho", diz Chico. "E também porque era para Sinal fechado, aquele disco em que só gravei música dos outros."
© Copyright Humberto Werneck in Chico Buarque Letra e Música, Cia da Letras, 1989