Notas sobre Pedro Pedreiro
Por Humberto Werneck
Letra
Chico já não era apenas "o irmão da Miúcha" quando, no começo de 1965, o escritor e psicanalista Roberto Freire - então à frente do recém-criado TUCA, o Teatro da Universidade Católica de São Paulo - lhe propôs um desafio: queria que ele musicasse o poema Morte e vida severina, de João Cabral de Melo Neto, que o grupo ia encenar. Roberto conhecera Chico através justamente de Miúcha, sua amiga, que o arrastou para um show no Colégio Santa Cruz, aí por 1961, 1962. "Você precisa ouvir", ela dissera, "umas coisas que o meu irmão mais novo está fazendo". O escritor não ficou nada impressionado com "o tal do Carioca - tímido, gago, atrapalhado, superbonito mas tocando um violão danado de ruim". Miúcha insistiu e nos primeiros meses de 1965 levou Chico à casa de Roberto Freire, numa noite em que lá estavam, entre outros, Alaíde Costa e Geraldo Vandré. Dessa vez ele cantou Pedro pedreiro, composta havia pouco - tinha sido apresentada numa daquelas producentes de Walter Silva no Paramount, o BO 65, no dia 29 de março. "Fiquei vidrado", lembra Roberto.
O carro-chefe era Pedro pedreiro, que a partir daí ele seria solicitado a apresentar onde quer que aparecesse. "Só me deixavam cantar essa", conta. Uma vez, nos bastidores do programa do Chacrinha, na TV Excelsior, um assistente do Velho Guerreiro, de nome Ramalhete, preocupado com a extensão da letra (sessenta versos), lhe propôs sem mais rodeios: "Não dá pra esse trem chegar mais cedo?" Não havendo acordo, o trem foi cancelado.
Pedro pedreiro - que Chico cantou para Tom Jobim no dia em que o conheceu, em 1966, levado pelo produtor Aloysio de Oliveira - não foi a sua única música onde passava um trem. Houve outra, bem anterior, a primeira que ousou cantar para Vinícius de Moraes.
...De algumas canções desses dois primeiros álbuns - A televisão, por exemplo - ele se sente muito distante. Outras, como Pedro pedreiro e Olê olá, lhe parecem merecedoras de "certa indulgência, por conta da juventude". E há uma, A Rita, que Chico ainda canta com prazer.
© Copyright Humberto Werneck in Chico Buarque Letra e Música, Cia da Letras, 1989