OBRA

CANÇÕES

LETRA

Pedaço de mim

Pedaço de mim

Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar

Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais

Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu

Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi

Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Leva os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus

Pedazo de mí

Versión de Silvia Ulrik y Roberto Echepare
 
Oh, pedazo de mí
Oh, mitad apartada de mí
Lleva tu mirar
Que la saudade es el peor tormento
Es peor que el arrumbamiento
Es peor que entenebrecer
Oh, pedazo de mi
Oh, mitad exilada de mi
Lleva tus señales
Que la saudade duele como un barco
Que de a poco describe un arco
Y evita abracar en el muelle

Oh, pedazo de mi
Oh, mitad arrancada de mi
Llévate tu rostro
Que la saudade es el revés de un parto
La saudade es arreglar el cuarto
Del hijo que ya murió

Oh, pedazo de mi
Oh, mitad amputada de mi
Lleva lo que hay de tí
Que la saudade duele latiendo
Es así como una puntada
En el miembro que ya perdí

Oh, pedazo de mí
Oh, mitad adorada de mí
Lava mis ojos
Que la saudade es el peor castigo
Y no quiero llevar conmigo
La mortaja del amor
Adiós.


1977 © Marola Edições Musicais
Todos os direitos reservados. Copyright Internacional Assegurado. Impresso no Brasil


Chico Buarque

Para a peça Ópera do malandro, de Chico Buarque (1978)

ENCONTRADA NO

ÁLBUM

CURIOSIDADES

Nota sobre Pedaço de mim
Análise literária de Maria Helena Sansão Fontes

     Letra 
"Pedaço de mim" aprofunda a questão da continuidade perdida, através de sextetos cuja simetria aponta para o cuidado na elaboração formal do poema, tanto mais que a melodia, repetindo-se por igual nas cinco estrofes, permite um tom quase declamatório aos versos:

O poema revela o apelo do eu-poético através da função conativa da linguagem, marcada pela interjeição que inicia os dois primeiros versos de cada estrofe e pela repetição do primeiro verso. A dor causada pela brusca separação dos corpos é assinalada pelos versos reveladores da passividade do emissor, onde a gradação dos verbos no particípio enfatiza o sentimento de castração involuntária:

"Metade afastada de mim"
"Metade exilada de mim"
"Metade arrancada de mim"
"Metade amputada de mim"
Esse apelo reiterado configura a insistência do eu-lírico em que a separação se estenda ao aspecto espiritual. É o que se observa nos terceiros versos das quatro primeiras estrofes, marcados pelo imperativo "Leva", seguido de expressões que conotam características abstratas e subjetivas do amante, contrapondo-se aos elementos fisicos:
"Leva o teu olhar"
"Leva os teus sinais"
"Leva o vulto teu"
"Leva o que há de ti"
A essa contundente despedida, acrescentam-se, nos três últimos versos de cada estrofe, comparações entre o sentimento da saudade e elementos representativos da dor e do sacrifício: "tormento", "esquecimento", "se entrevar".
A dor da separação compara-se tanto a elementos abstratos, como na terceira estrofe, na imagem que marca a oposição morte/nascimento: "Que a saudade é o revés de um parto/A saudade é arrumar o quarto/ Do filho que já morreu", como a elementos fisicos: "Que a saudade dói latejada/ É assim como uma fisgada/ No membro que já perdi"(quarta estrofe).

O lamento cadenciado do poema-canção culmina com o apelo final que configura a entrega do ser que não se quer mutilado e em lugar da separação, presente nas estrofes anteriores, existe a fusão propiciada pela morte: "Leva os olhos meus/ Que a saudade é o pior castigo/ E eu não quero levar comigo/ a mortalha do amor/ Adeus"

Sem fantasia - Masculino e feminino em Chico Buarque
Maria Helena Sansão Fontes - Editora Graphia, 1999

Chico Buarque

Chico

Em 58 anos de carreira, compôs centenas de canções, aqui apresentadas por título, data, compostas em parcerias, versões e adaptações, compostas para teatro, cinema e aquelas que só aparecem em discos de outros intérpretes. Suas músicas foram gravadas em cerca de 40 álbuns, organizados por data, projetos, discos solo, gravações ao vivo, coletâneas e discos de outros intérpretes dedicados a ele. A obra completa do artista é uma das maiores riquezas que a cultura brasileira produziu até hoje.

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